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RECOMENDAÇÃO SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO - SME/CME Nº 3 de 2 de Dezembro de 2025

Recomenda sobre a Consolidação das Dimensões da Qualidade e Equidade na Educação Infantil no Sistema Municipal de Ensino de São Paulo

São Paulo, 02 de dezembro de 2025.

 

Processo SEI nº 6016.2025/0141520-6

Interessado: Conselho Municipal de Educação - CME/SP

Assunto: Recomendação sobre a Consolidação das Dimensões da Qualidade e Equidade na Educação Infantil no Sistema Municipal de Ensino de São Paulo

Relatoria: CEIFAI - Beatriz Cardoso, Cristina Margareth de Souza Cordeiro, Fátima Cristina Abrão, Simone Aparecida Machado, Sueli Aparecida de Paula Mondini, Lucimeire Cabral de Santana, Carmen Lucia Bueno Valle e Silvana Lucena dos Santos Drago.

Recomendação CME nº 03/2025

Aprovado em  Sessão Plenária de 27/11/2025

 

1. Introdução

 

O Conselho Municipal de Educação (CME) é órgão normativo e deliberativo vinculado à Secretaria Municipal de Educação (SME), com atribuições de propor encaminhamentos sobre o funcionamento do Sistema Municipal de Ensino, elaborar normas próprias e complementares às diretrizes do Conselho Nacional de Educação (CNE), assessorar o Executivo Municipal na formulação e avaliação das políticas educacionais e acompanhar a implementação das metas do Plano Municipal de Educação (PME).

 

Considerando:

1. a publicação da Resolução CNE/CEB nº 01/2024, que institui Diretrizes Operacionais Nacionais de Qualidade e Equidade para a Educação Infantil, o CME iniciou a revisão de seus atos normativos, com o objetivo de assegurar a coerência entre as normas municipais e os referenciais nacionais, reafirmando os princípios da educação integral, inclusiva e equitativa;

2. o levantamento comparativo entre a Resolução CNE/CEB nº 01/2024 e a Resolução SME/CME nº 02/2024, que evidenciou convergência entre ambas e apontou a necessidade de atualizar alguns aspectos ainda não contemplados nas normativas municipais para abordar de modo mais sistemático a transição entre etapas da Educação Básica, em especial entre a Educação Infantil, os anos iniciais e os anos finais do Ensino Fundamental;

3. o estudado do Caderno de Orientação – Conselhos Municipais de Educação, produzido pela UNCME, em sessões da CEIFAI, quando foi constatado que muitas das orientações encontram-se contempladas em normativas no município de São Paulo, no entanto, foram observados alguns aspectos que podem ser revistos no âmbito do Sistema Municipal de Ensino, seja por questões de conteúdo, seja por abrangência do que já está publicado, foram mapeados com base nas dimensões da Resolução CNE/CEB nº 01/2024. Os aspectos a serem revistos.

 

2. Fundamentação e princípios

 

O estudo comparativo entre a Resolução CNE/CEB nº 01/2024 e as normativas municipais — especialmente as Resoluções SME/CME/SP nº 01/2020 e nº 02/2024, elaboradas para as Unidades privadas do Sistema Municipal de Ensino de São Paulo — evidenciou convergências significativas quanto à valorização das infâncias, aos princípios e valores, à avaliação, à formação de professores, à participação da família, à organização dos tempos e espaços educativos e à necessidade de práticas pedagógicas que promovam o desenvolvimento integral das crianças, respeitando suas singularidades e contextos socioculturais.

Observa-se que a Resolução SME/CME nº 2/2024 alinha-se de forma consistente à Resolução CNE/CEB nº 1/2024, ao mesmo tempo em que avança no detalhamento de instrumentos regulatórios, operacionais e formativos em aspectos como: 

avaliação institucional participativa;

documentação pedagógica como instrumento formativo; 

exigências de articulação com os direitos das crianças, inclusão e equidade; 

organização dos tempos, espaços e materialidades como eixos do currículo. 

Entretanto, identificou-se a necessidade de evidenciar alguns temas que necessitam de ajustes:

● Diretrizes operacionais com abrangência para todo o sistema educacional com foco em qualidade e equidade para a educação infantil;

● a transição entre etapas da Educação Básica (Educação Infantil, anos iniciais e finais do Ensino Fundamental);

● a busca ativa e o acompanhamento da frequência como parte da permanência e da proteção social (público da educação infantil, educação indígena, educação especial);

● a formação e identidade profissional docente, considerando os tempos de vida e os desafios da docência contemporânea;

● profissionais de apoio (auxiliares);

● processo de apropriação da linguagem escrita;

● infraestrutura, edificações e materiais (materiais de acabamento que considerem a cultura local, construções, reformas e usos de espaço escolar alinhados à adaptação às mudanças climáticas e à preservação do planeta, assegurando conforto, saúde, segurança e acessibilidade).

● a avaliação processual e institucional participativa em qualidade e equidade da RME; e

● a revisão dos Regimentos e Projetos Político-Pedagógicos (PPP) à luz da gestão democrática e da articulação curricular.

 

 

3. Considerações

 

As dimensões da qualidade da Educação Infantil apresentadas na Resolução CNE/CEB nº 1/2024 – gestão democrática, identidade e formação profissional, proposta pedagógica, avaliação da Educação Infantil e Infraestrutura, edificações e materiais, foram utilizadas para organizar as considerações que relacionam as normatizações do CME e os temas que necessitam de ajustes apontados anteriormente.

 

1. Gestão democrática

Relacionado ao âmbito da gestão democrática, a Resolução CME 02/2024 ressalta a importância da constituição dos colegiados para representatividade dos adultos que participam e constroem o cotidiano da Educação Infantil e entende que instâncias participativas também devem ser constituídas com as crianças:

Art. 104. Com a finalidade de garantir a gestão democrática - participação, transparência e socialização - o Regimento das Unidades Privadas de Educação Infantil pode prever órgãos de apoio, tais como: Conselho de Escola, Conselho Mirim, Associação de Pais e Mestres, Assembleia Mirim.

Além disso, nesta dimensão se inserem temas indissociáveis da garantia do direito à educação: acesso e permanência, relação da educação infantil com o Ensino Fundamental, intersetorialidade e rede de proteção da criança, busca ativa, transição entre educação infantil e ensino fundamental e educação indígena. Estes elementos serão objeto de detalhamento nesta Recomendação e na Resolução a ser proposta para o Sistema Municipal de Ensino.

· Acesso e permanência

No que se refere ao acesso e à permanência, o Sistema Municipal de Ensino de São Paulo dispõe de fundamentos normativos que asseguram a Educação Infantil como direito de todas as crianças. A Resolução CME nº 01/2020 afirma que o acolhimento, o reconhecimento das singularidades e a continuidade das experiências constituem princípios estruturantes da permanência, garantindo o direito às brincadeiras e interações, à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à dignidade e à convivência, configurando a Educação Infantil como espaço de formação integral.

A Recomendação CME nº 07/2021, ao tratar da Busca Ativa Escolar, reafirma que permanecer não se limita à matrícula ou à presença física, mas envolve vínculos, participação e cuidado, compreendendo a escola como espaço de vida e pertencimento. De modo complementar, a Recomendação CME nº 01/2023 orienta que os Projetos Político-Pedagógicos considerem o diagnóstico do território, as desigualdades e as condições concretas de participação das crianças e de suas famílias, reconhecendo que a permanência se constrói cotidianamente na qualidade das relações, na organização dos tempos e espaços e nas possibilidades de expressão, convivência, exploração, brincadeira e aprendizagem.

A Recomendação CME nº 02/2022 reforça que tal direito é incondicional também para bebês e crianças público da educação especial, assegurando matrícula e frequência sem exigência de laudo, acolhimento respeitoso, oferta de apoios, recursos de acessibilidade e Atendimento Educacional Especializado quando necessário, na perspectiva do Desenho Universal para a Aprendizagem. Assim, garantir permanência significa criar condições para que as crianças vivam, participem e transformem a escola, e não apenas a frequentem.

· Intersetorialidade e rede de proteção da criança

A proteção integral e o desenvolvimento das crianças, garantidos pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, são compreendidos pelo Sistema Municipal de Ensino como responsabilidades que se efetivam por meio da articulação entre Educação, Saúde, Assistência Social, Direitos Humanos e demais políticas públicas do território. No Município de São Paulo, o Decreto nº 57.804/2017 institui o Pacto Municipal pela Primeira Infância, estabelecendo a corresponsabilidade entre SME, SMS e SMADS para o acompanhamento integrado das crianças e de suas famílias, considerando condições de cuidado, vínculos, saúde, moradia e participação comunitária. De modo convergente, o Decreto nº 57.379/2016, regulamentado pela IN 14/2025, que define a Política Municipal de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, reafirma a necessidade de ações articuladas entre SME, SMPED, SMADS e SMS para assegurar acesso, permanência e participação das crianças público da educação especial, reconhecendo que inclusão é indissociável da rede de proteção social.

A Recomendação CME nº 02/2022 reforça que somente por meio de ações intersecretariais articuladas poderão ser asseguradas às crianças público da educação especial e às suas famílias as condições para o exercício pleno do direito à educação, em diálogo com os demais direitos fundamentais, como saúde, moradia, alimentação, transporte e lazer. Nesse sentido, orienta-se a constituição de programas intersetoriais formalizados por Decreto, visando à garantia do acesso e da permanência, contemplando ações articuladas no território, otimizando serviços e garantindo respostas céleres às necessidades básicas do estudante e de sua família.

No âmbito da organização da escola, a Recomendação CME nº 01/2023 estabelece que os Projetos Político-Pedagógicos devem considerar o diagnóstico do território e identificar a rede de apoio, proteção e garantia de direitos disponível no entorno, articulando estratégias de acolhimento, acompanhamento e encaminhamento. Assim, a intersetorialidade não se configura como ação acessória, mas como dimensão estruturante da permanência, especialmente para crianças que vivenciam situações de vulnerabilidade, risco social ou barreiras que impactem suas possibilidades de conviver, participar, brincar e aprender em condições de dignidade.

· Busca Ativa

A Recomendação CME nº 07/2021, elaborada no contexto da pandemia de COVID-19 e fundamentada em estudos da UNICEF (2021), define a Busca Ativa Escolar como estratégia metodológica intersetorial que integra o conjunto de ações cotidianas das unidades educacionais, constituindo-se como instrumento de concretização da função social da escola e de defesa da vida, da cidadania e da humanização. Essa Recomendação destaca que a busca ativa não se limita à verificação burocrática de ausências, mas envolve o acompanhamento da frequência e participação das crianças, a análise de faltas consecutivas e/ou interpoladas, estratégias de acolhimento à criança e à família, identificação de fatores de vulnerabilidade e riscos, e articulação com a rede de proteção quando necessário.

Nesse sentido, a Recomendação CME nº 02/2022 reforça a busca ativa como ação sistemática e intersecretarial, envolvendo Educação, Saúde, Assistência Social e Direitos Humanos para localizar bebês, crianças, jovens e adultos excluídos do processo escolar e garantir seu ingresso e permanência. Essa Recomendação também orienta que as unidades educacionais, em diálogo com as equipes de Saúde, realizem orientação às famílias e responsáveis sobre a importância da matrícula de bebês e crianças com deficiência, Transtorno Global do Desenvolvimento, Transtorno do Espectro Autista e Altas Habilidades/Superdotação, especialmente nos casos em que a identificação inicial ocorre nos serviços de Saúde.

Assim, recomenda-se que as unidades educacionais, ao elaborarem e revisarem seus Projetos Político-Pedagógicos, conforme a Recomendação CME nº 01/2023, identifiquem e articulem a rede de apoio e proteção do território, reconhecendo a intersetorialidade como dimensão estruturante do acesso, permanência e participação das crianças na Educação Infantil.

Por fim, ressalta-se que, por ter sido originalmente dirigida às instâncias internas da SME, a Recomendação CME nº 07/2021 não alcança ainda todo o Sistema Municipal de Ensino, indicando a necessidade de normatização ampliada pelo CME, especialmente à luz da previsão da busca ativa para crianças de 0 a 5 anos na normativa nacional vigente.

· Transição - Na Educação Infantil e entre etapas

A transição no decorrer dos anos da Educação Infantil e da Educação Infantil para o Ensino Fundamental deve ser concebida como um processo pedagógico e de cuidado, orientado pelo reconhecimento da continuidade dos percursos educativos e pelo respeito às singularidades das infâncias. Considera-se, assim, os diferentes tempos, modos e ritmos de aprender dos bebês e das crianças, assegurando experiências que promovam seu desenvolvimento integral e a construção de suas identidades.

Conforme estabelece o Art. 11 da Resolução SME/CME nº 01/2020, as articulações realizadas nesse período constituem ações intencionais que requerem planejamento cuidadoso, acompanhamento das equipes das Unidades Educacionais e atenção ao acolhimento, sem antecipação de conteúdos próprios do Ensino Fundamental. Trata-se de garantir integração e continuidade, evitando rupturas que possam comprometer tanto a experiência das crianças quanto o trabalho das/os educadoras/es envolvidas/os.

A transição não se resume à passagem administrativa entre etapas, mas se concretiza em articulações curriculares contínuas. Tais articulações reconhecem cada criança como sujeito de direitos, com dimensões biopsicossociais que exigem cuidado, intencionalidade e escuta, reafirmando uma concepção de educação integral, equitativa e inclusiva. Nessa direção, a Recomendação CME nº 01/2023 destaca a importância de que os Projetos Pedagógicos explicitem concepções de infâncias, adolescências, juventudes e vida adulta ao longo da trajetória educativa, reconhecendo a diversidade de experiências e identidades de cada fase da vida e sua implicação nas transformações físicas, psicológicas e sociais, bem como as experiências e identidades que marcam cada fase da vida.

No âmbito nacional, a Resolução CNE/CEB nº 1/2024 reforça, em seu Art. 4º, inciso VII, que os sistemas de ensino devem assegurar mecanismos institucionais de transição entre Educação Infantil e Ensino Fundamental, contemplando estratégias de acolhimento às crianças e às famílias, bem como o compartilhamento de informações entre as equipes escolares que assegurem o desenvolvimento das múltiplas linguagens, das interações e da brincadeira como bases do trabalho pedagógico, respeitando as singularidades da infância. O Art. 13, inciso III, orienta ainda a atenção ao desenvolvimento das múltiplas linguagens, ao investimento pedagógico nos processos de apropriação da leitura e da escrita e ao reconhecimento das interações e brincadeiras como eixos estruturantes do trabalho educativo, respeitando as singularidades das crianças.

Em consonância com o Art. 22 da LDB, cada etapa da Educação Básica possui objetivos específicos, mas todas compartilham a responsabilidade de promover o desenvolvimento integral do educando, assegurar formação cidadã e favorecer a continuidade dos estudos, conforme reforça o parágrafo único são objetivos precípuos da educação básica a alfabetização plena e a formação de leitores. Por isso, a transição deve reafirmar o compromisso da escola com o percurso educativo como um todo, considerando os tempos de vida, ritmos de aprendizagem e formas de participação das crianças.

Dessa forma:

• na Educação Infantil, devem-se proporcionar experiências significativas com a linguagem, com textos e situações reais de comunicação, em diálogo com as brincadeiras e interações;

• nos anos iniciais do Ensino Fundamental, cabe realizar o processo sistemático e intencional de alfabetização, em consonância com a BNCC e com as propostas curriculares do sistema de ensino, respeitando os tempos e modos de aprender de cada criança.

• O ingresso no Ensino Fundamental aos seis anos de idade não altera a condição da criança como sujeito da infância, tampouco elimina seus direitos à brincadeira e às interações como fundamentos do desenvolvimento e da aprendizagem. Conforme previsto na Constituição Federal (Art. 227), na LDB (Art. 29 e Art. 32), nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil e para o Ensino Fundamental e na BNCC, a escola deve assegurar, práticas educativas que integrem o brincar, a exploração, a imaginação, a pesquisa e as múltiplas linguagens como eixos estruturantes do trabalho pedagógico. Assim, os anos iniciais do Ensino Fundamental devem manter tempos, espaços, materialidades e propostas pedagógicas que preservem e favoreçam experiências lúdicas, corporais, sensoriais, estéticas e culturais, garantindo que as crianças continuem brincando, convivendo, explorando e aprendendo em contextos

socialmente compartilhados, coletivos e inclusivos.

Assim, identifica-se que o Sistema Municipal já possui base normativa consistente sobre a transição entre etapas da educação básica. Contudo, observa-se a necessidade de regulamentação complementar, por parte deste Conselho, compondo orientações específicas às instâncias da SME, às DREs e às Unidades Educacionais.

· Educação Indígena

O documento Currículo da Cidade: Povos Indígenas – Orientações Pedagógicas (SME/COPED, 2023) reafirma a necessidade de superar visões coloniais e estereotipadas que reduzem os povos indígenas a uma categoria homogênea, destacando sua diversidade cultural, linguística e histórica (pp. 8–24)

Apresenta narrativas próprias de origem, modos de relação com o território e formas de transmissão de conhecimentos que configuram outras pedagogias e concepções de infância (pp. 26–50), evidencia processos de resistência e protagonismo político indígena (pp. 52–80) e enfatiza a presença indígena contemporânea na cidade de São Paulo, convocando a escola a reconhecê-la e integrá-la ao cotidiano, para além de práticas folclorizadas ou pontuais (pp. 82–95)

Desta forma, este Conselho Municipal de Educação orienta que o trabalho pedagógico nas Unidades de Educação Infantil e Ensino Fundamental considere os princípios presentes no Currículo da Cidade: Povos Indígenas – Orientações Pedagógicas (SME/COPED, 2023):

· As Unidades devem incorporar, na elaboração e revisão de seus Projetos Pedagógicos, narrativas e conhecimentos indígenas que expressem diferentes modos de relação com o território, com o tempo e com as formas de aprender, bem como reconhecer pedagogias da infância que se constituem a partir dessas cosmologias (pp. 26–50)

· Devem, ainda, considerar as formas contemporâneas de resistência e protagonismo político dos povos indígenas (pp. 52–80) e reconhecer sua presença atual na cidade de São Paulo, de modo que as práticas educativas não se limitem a datas comemorativas ou abordagens folclorizadas, mas expressem convivência, pertencimento e pluralidade cultural (pp. 82–95)

 

Observa-se que o documento Currículo da Cidade: Povos Indígenas (SME/COPED, 2023) está alinhado aos princípios da Resolução CNE/CEB nº 01/2024. Cabe, portanto, reforçar a necessidade de orientações objetivas às Unidades Educacionais para que esse alinhamento se concretize na revisão dos Projetos Políticos-Pedagógicos, na organização das práticas curriculares e nos processos de formação continuada.

 

2. Identidade e formação profissional

A Resolução CME nº 01/2020 define que o processo formativo das educadoras e educadores da Educação Infantil deve ser contínuo, situado e articulado às práticas cotidianas da Unidade Educacional. Conforme o Art. 12, a formação permanente está ancorada no Projeto Pedagógico, na perspectiva colaborativa e na reflexão crítica das práticas, integrando a apropriação de referenciais teórico-científicos, o estudo das normativas curriculares, a troca de experiências e o apoio à divulgação de práticas inovadoras. A gestão pedagógica da Unidade constitui espaço estruturante desse processo, especialmente nas reuniões pedagógicas e nos coletivos de estudo.

No que se refere à formação inicial, a Resolução CME nº 04/2019 estabelece a exigência de Licenciatura em Pedagogia ou Normal Superior para atuação na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, admitindo-se como formação mínima, conforme legislação anterior à LDB/1996, o curso Normal em nível médio. Em relação à Educação Escolar Indígena e à Educação Especial na perspectiva inclusiva, remetem-se os critérios a normas específicas vigentes.

Observa-se, entretanto, que o Sistema Municipal de Ensino ainda não dispõe de normativas que tratem do perfil profissional e da constituição da identidade docente na Educação Infantil. A Resolução CME nº 01/2024 aponta a necessidade da explicitação deste perfil nos Projetos Pedagógicos, sem diretrizes para sua elaboração.

Considerando que a profissionalidade docente é construída nas relações que definem o cotidiano escolar — escolhas curriculares, modos de organização dos tempos e espaços, interações, práticas culturais e concepções de infância — o desenvolvimento profissional deve reconhecer que se aprende em diferentes tempos, espaços e modos, mas que, na escola, o processo formativo é intencional, diretamente vinculado ao trabalho pedagógico e às responsabilidades ético-políticas da docência.

Dessa maneira, este Conselho indica que a elaboração de uma Matriz de Desenvolvimento Profissional docente é fundamental e que deverão ser adotados como parâmetros para sua elaboração as dimensões estabelecidas na BNC Formação Continuada – Resolução CNE/CP 01/2020:

I. Conhecimento profissional: o domínio dos conteúdos e saber como ensiná-los, demonstrar conhecimento sobre os alunos e seus processos de aprendizagem, reconhecer os diferentes contextos e conhecer a governança e a estrutura dos sistemas educacionais.

II. Prática profissional: o professor deve planejar as ações de ensino que resultem na aprendizagem efetiva, saber criar e gerir ambientes de aprendizagem, ter plenas condições de avaliar a aprendizagem e o ensino, e conduzir as práticas pedagógicas dos objetos do conhecimento, competências e habilidades previstas no currículo.

III. Engajamento profissional: compromisso do professor com seu próprio desenvolvimento profissional, com a aprendizagem dos estudantes e com o princípio de que todos são capazes de aprender. Também deve participar da elaboração do projeto pedagógico da escola e da construção de valores democráticos. Além de ser engajado com colegas, famílias e toda a comunidade escolar.

 

E ainda:

· a explicitação dos saberes, competências e responsabilidades inerentes à docência na infância;

· o reconhecimento das trajetórias de desenvolvimento ao longo da carreira;

· a articulação da formação interna (na escola), formação externa e autoformação;

· a valorização da prática reflexiva como fundamento do trabalho docente.

Tal matriz deve considerar que o lugar privilegiado da formação é a própria Unidade Educacional, sendo espaço de elaboração e reconstrução do conhecimento pedagógico, de maneira articulada à prática.

 

3. Proposta Pedagógica

A Resolução SME/CME nº 01/2020 estabelece as diretrizes para a atualização dos Currículos da Educação Infantil no Sistema Municipal, reafirmando os eixos estruturantes: brincadeiras e interações, a indissociabilidade entre educar e cuidar, a mediação intencional dos educadores, a interação entre crianças e adultos, e o currículo como construção social que expressa concepções de infância, de conhecimento e de escola.

A Recomendação CME nº 01/2023, ao orientar a elaboração e revisão dos Projetos Político-Pedagógicos na perspectiva dos Direitos Humanos, da inclusão e da equidade, para todo o sistema de ensino, destaca a importância do diagnóstico da demanda atendida, dos profissionais e do contexto do território, da definição participativa de finalidades e objetivos, do plano de gestão, da articulação com as famílias e da implementação de práticas pedagógicas que considerem diversidade, cultura local, inovação e redução das desigualdades.

A Resolução SME/CME nº 02/2024, em seu Art. 10, reafirma que o Projeto Pedagógico deve garantir aos bebês e às crianças o acesso a processos de apropriação, renovação e articulação de experiências éticas e estéticas, conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens, assim como o direito às brincadeiras e interações, à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à dignidade e à convivência.

Esses marcos convergem com os Direitos de Aprendizagem e Desenvolvimento da BNCC (2017), que asseguram às crianças o direito de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se, construindo identidades e pertencimentos.

Entretanto, identifica-se, no âmbito deste Conselho, a necessidade de normatização mais específica sobre:

I. a atenção ao desenvolvimento das múltiplas linguagens, ao investimento pedagógico nos processos de apropriação da leitura e da escrita, considerando que:

· apoiar a criança em seu processo de apropriação da cultura escrita não significa antecipar a alfabetização escolar;

· as múltiplas linguagens devem ser reconhecidas e tratadas de forma não hierarquizada;

· os tempos, espaços e materialidades devem favorecer experiências significativas de narrativa, escuta, circulação de textos em situações reais de comunicação.

II. a Educação para a Diversidade e Relações Étnico-Raciais, de modo a explicitar o compromisso com uma educação antirracista, que previne e enfrenta o racismo e a xenofobia e promove a valorização das diferentes identidades étnico-raciais.

 

Assim, a elaboração ou revisão dos Projetos Político-Pedagógicos deve considerar se o cotidiano:

· garante experiências variadas com textos, histórias, registros e práticas culturais;

· preserva o lugar central do brincar e das interações;

· sustenta práticas que reconheçam a infância como tempo de criação, imaginação, autoria e participação;

· organiza-se de modo a reconhecer e valorizar as identidades pessoais, culturais e étnico-raciais das crianças, dos familiares e dos profissionais da Unidade Educacional;

· respeita os princípios da educação laica no atendimento público;

· assegura e reafirma as identidades étnicas, a língua materna, os saberes e tradições das comunidades e dos povos indígenas;

· valoriza as diferenças e combate quaisquer formas de preconceito e discriminação;

· promove ações de formação visando o respeito à multiplicidade de organizações familiares.

 

4. Avaliação da Educação Infantil

A Resolução CME nº 02/2024 estabelece, em seu Art. 67, que a avaliação na Educação Infantil ocorre em duas dimensões complementares:

I. Autoavaliação institucional participativa, que resulte em diagnóstico coletivo sobre a qualidade das experiências educativas ofertadas pela Unidade;
II. Revisão anual do Projeto Pedagógico e dos planos de ação, orientada pelos resultados dessa autoavaliação.

Parágrafo único. A autoavaliação e a (re)elaboração do Projeto Pedagógico devem envolver toda a equipe da Unidade Educacional, visando ao aprimoramento das condições de trabalho, à valorização profissional e à melhoria da qualidade da educação oferecida aos bebês e às crianças.

Além disso, o Art. 24 da Resolução CNE/CEB 01/2024 determina que a proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve definir estratégias, instrumentos e procedimentos de acompanhamento permanente e individualizado das aprendizagens e do desenvolvimento, bem como as formas, periodicidade e utilização dos registros produzidos.

Ainda no âmbito nacional, reconhece-se o movimento do SAEB/INEP para construção de referenciais de monitoramento e avaliação da Educação Infantil. Esses estudos reafirmam que a qualidade é uma construção histórica, cultural e contextual e, ao mesmo tempo, dialoga com parâmetros nacionais que asseguram direitos e condições de oferta (BRASIL, MEC, 2006; 2009; 2018; 2019).

Diante disso, embora o Sistema Municipal de Ensino disponha de base normativa consistente, faz-se necessária a regulamentação complementar que detalhe:

a) orientações específicas para a atualização do INDIQ, dos processos e instrumentos da autoavaliação institucional nas Unidades;

b) procedimentos para o acompanhamento permanente e individualizado das aprendizagens e do desenvolvimento dos bebês e das crianças;

c) diretrizes para a interpretação de dados externos (como SAEB), de modo

a evitar práticas de escolarização precoce ou induções à lógica de desempenho individual, reafirmando a centralidade das interações, da brincadeira e do direito à infância;

d) orientações específicas para elaboração de indicadores que auxiliem a avaliação das práticas pedagógicas.

 

5. Infraestrutura, Edificações e Materiais

A Resolução SME/CME nº 02/2024 define padrões básicos para infraestrutura, edificações e materiais nas Unidades de Educação Infantil, considerando a segurança, acessibilidade, conforto ambiental, qualidade dos espaços e adequação à experiência das crianças pequenas.

A Resolução CNE/CEB nº 1/2024 amplia essa perspectiva, incluindo dimensões relacionadas às culturas locais, à promoção de ambientes seguros e resilientes e à adaptação das instituições em contextos de desastres ambientais.

No contexto municipal, identificam-se dois pontos que exigem regulamentação complementar:

a) a definição de parâmetros para adequação climática e sustentabilidade ambiental nas edificações, privilegiando soluções que considerem ventilação natural cruzada, sombreamento, cobertura vegetal e manejo de áreas externas, reduzindo a dependência de ventilação artificial;

b) a incorporação de estratégias de prevenção e resposta a eventos climáticos extremos, em articulação com políticas de proteção e defesa civil, garantindo segurança física e bem-estar das crianças e profissionais.

Tais aspectos dialogam com o princípio do direito ao ambiente educativo saudável, esteticamente cuidado e seguro, reconhecendo que a qualidade dos espaços é parte constitutiva da experiência pedagógica na infância.

 

6. Recomendações Finais

Considerando o estudo comparativo entre a Resolução CNE/CEB nº 1/2024 e as normativas do CME/SP vigentes, bem como as análises apresentadas nesta Recomendação, o Conselho Municipal de Educação de São Paulo apresenta proposta de Resolução complementar, com abrangência para todo o Sistema Municipal de Ensino, com vistas a:

a) Atualizar diretrizes operacionais para a Educação Infantil, assegurando coerência com a Resolução CNE/CEB nº 1/2024, especialmente no que se refere à qualidade, equidade e garantia de direitos;

b) Normatizar a transição entre Educação Infantil e anos iniciais, definindo princípios pedagógicos, responsabilidades institucionais e formas de acompanhamento;

c) Fomentar o debate para ampliar a compreensão e a criação de instrumentos consensuados para a avaliação e monitoramento da qualidade da Educação Infantil no Sistema Municipal de Ensino;

d) Indicar a importância do estabelecimento de matriz de desenvolvimento profissional docente na Educação Infantil, articulando formação continuada e autoformação, de acordo com os princípios da profissionalidade docente e da gestão democrática;

e) Atualizar e consolidar parâmetros de infraestrutura e adaptação climática dos ambientes educativos da primeira infância, assegurando para todos conforto ambiental, acessibilidade e sustentabilidade;

f) Manifestar-se sobre a universalização da visão sobre a cultura indígena, garantindo respeito aos modos próprios de educar, às línguas e às cosmologias das comunidades indígenas;

g) assegurar, na Educação Infantil, a plena observância dos direitos das crianças público da Educação Especial, em conformidade com a Resolução CNE/CEB nº 1/2024, com a Lei nº 12.764/2012 (Lei Berenice Piana), com a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei nº 9.394/1996) e demais normativas pertinentes, garantindo:

I. matrícula e permanência incondicionais, vedada a exigência de laudo ou diagnóstico como condição de acesso ou continuidade;

II. oferta do Atendimento Educacional Especializado – AEE, assegurando condições de acesso, participação, permanência e aprendizagem das crianças.

h) garantir que a organização do atendimento contemple a identificação, prevenção e eliminação de barreiras arquitetônicas, pedagógicas, comunicacionais, digitais, metodológicas, atitudinais e de quaisquer outras naturezas que restrinjam ou impeçam a inclusão das crianças nas atividades da Educação Infantil;

i) elaborar Plano de Atendimento Educacional Especializado para cada criança público da educação especial, documento obrigatório, individualizado e de natureza pedagógica;

j) garantir que o plano de atendimento educacional especializado seja elaborado em diálogo com os profissionais que atuam com a criança e com seus familiares ou responsáveis, assegurando participação, corresponsabilidade e proteção de dados sensíveis, nos termos da legislação vigente;

k) garantir que o professor responsável pelo AEE tenha formação inicial que o habilite ao exercício da docência e, preferencialmente, com formação específica para a educação especial inclusiva;

l) organizar a atuação do profissional de apoio, quando necessário e fundamentado no estudo de caso realizado pelo professor do AEE;

m) Ampliar a Recomendação CME nº 07/2021 (Busca Ativa) para todo o Sistema Municipal de Ensino, de forma articulada entre educação, saúde, assistência social e proteção integral;

n) Definir que a proporção máxima de bebês e crianças por professor regente, deverá ser cumprida progressivamente, conforme metas estabelecidas no Plano Municipal de Educação;

o) Definir os auxiliares de sala como trabalhadores da educação, sem formação específica para o magistério, em função não equivalente à docência, com vista a atuação sob a liderança e supervisão do professor regente de cada agrupamento.

 

DELIBERAÇÃO DA PLENÁRIA

 

O Conselho Municipal de Educação, aprova a presente Recomendação.

 

São Paulo, 27 de novembro de 2025

 

Sueli Aparecida de Paula Mondini

Presidente do Conselho Municipal de Educação - CME

 

 

Referências legais e bibliográficas

BRASIL. Ministério da Educação. Resolução CNE/CEB nº 1, de 17 de outubro de 2024 Institui as Diretrizes Operacionais Nacionais de Qualidade e Equidade para a Educação Infantil. Brasília: MEC/CNE, 2024.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em:https://basenacionalcomum.mec.gov.br. Acesso em: 10 nov. 2025.

BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Sistema de Avaliação da Educação Básica – SAEB. Brasília: MEC/INEP, 2019.

SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Conselho Municipal de Educação. Resolução SME/CME nº 1, de 2020. Dispõe sobre as diretrizes para atualização dos currículos da Educação Infantil no Sistema Municipal de Ensino. São Paulo: SME/CME, 2020.

SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Conselho Municipal de Educação. Resolução SME/CME nº 2, de 2024. Dispõe sobre normas de funcionamento das unidades privadas de Educação Infantil do Sistema Municipal de Ensino. São Paulo: SME/CME, 2024.

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SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Conselho Municipal de Educação. Resolução CME nº 01/2024. Dispõe sobre a identidade profissional docente e a elaboração dos Projetos Pedagógicos. São Paulo: SME/CME, 2024.

SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Instrução Normativa SME nº 16, de 16 de maio de 2024. Dispõe sobre a organização e funcionamento dos Centros de Educação Infantil Indígena (CEIIs) e Centros de Educação e Cultura Indígena (CECIs). São Paulo: SME, 2024.

SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Instrução Normativa SME nº 25, de 13 de setembro de 2023. Dispõe sobre critérios e procedimentos para credenciamento de organizações da sociedade civil para atendimento nos CECIs e CEIIs. São Paulo: SME, 2023.

SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Educação. Instrução Normativa SME nº 45, de 20 de dezembro de 2024. Altera a Instrução Normativa SME nº 16/2024. São Paulo: SME, 2024.

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SÃO PAULO (Município). Decreto nº 57.379, de 13 de outubro de 2016. Institui a Política Municipal de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva. São Paulo: PMSP, 2016.

SÃO PAULO (Município). Decreto nº 57.804, de 13 de julho de 2017. Institui o Pacto Municipal pela Primeira Infância. São Paulo: PMSP, 2017.

UNCME – União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação. Caderno de Orientação: Conselhos Municipais de Educação. Brasília: UNCME, 2023.

UNICEF. Busca Ativa Escolar: estratégias para garantir o direito à educação. Brasília: UNICEF, 2021.

Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da Cidade de São Paulo